quarta-feira, 18 de abril de 2012

O Assassinato da asquerosa
                Jorjão era um cara deficiente (obeso e neuropsiquiátrico), que fazia drama com as situações mais banais do nosso cotidiano.  Coisas que não daríamos à menor importância ou valor, Jorjão (com seus 36 anos) era capaz de chamar a polícia para registrar um B.O., para investigar a morte da sua asquerosa, isto é, sua barata de estimação.   Sua mãe, que já conhecia bem suas psicoses, mal dava importância.     Certa manhã, a mãe de jorjão saiu cedo para fazer compras, pois não gostava de enfrentar filas, deixando Jorjão ainda dormindo.  Quando voltava para casa, percebeu uma aglomeração de pessoas em frente à sua casa e de cara,  já desconfiando que tivesse algo à ver com seu filho.   Uma das vizinhas veio correndo na direção de dona Geralda, gritando:
- Comadre, comadre, depressa, venha logo !!
- Calma mulher, o que é que houve ? (responde dona geralda).
- Tá se ouvindo gritos lá de dentro da sua casa.
- Da minha casa ?  Que gritos ?
- Alguém lá dentro está chamando alguém de assassino.  Já chamei a polícia.
- Você fez o quê ?
- Chamei a polícia, houve uma morte lá dentro, criatura.

A vizinhança inteira na maior euforia, só querendo ver o circo pegar fogo, pra ter assunto para o resto do mês, pois a rua andava meio que sem assunto pra fofocar.  Um detalhe passou despercebido.  Ninguém na rua sabia do problema mental do Jorjão, pois dona geralda o mantinha dentro de casa, justamente para evitar problemas e fofocas, pois dona geralda já fora forçada à mudar de casa duas vezes, por causa dos ataques do seu filho Jorjão e é óbvio que ninguém, da nova vizinhança, ainda sabia disso, o que só fazia aumentar a falação e o pavor, diante de mais uma crise do filho.

Dona geralda despediu-se da vizinha que chamara a polícia e entrou.  Ao entrar, viu Jorjão deitado no chão, em prantos sobre o tapete e perguntou:

- O que houve agora filho ?
- mataram ela mãe, mataram ela. ( e caía aos prantos).

Quando dona geralda chegou mais perto, viu do que se tratava.   Jorjão estava com a cara bem encima de uma barata morta e esmagada no chão, pisotiada por um “suposto assassino”.

Lá fora na rua, a vizinhança alvoriçada com o suposto assassinato, quando chegou o carro da polícia civil, tocando cirene e buzinando, para abrir caminho no meio da multidão que já havia se formado.  Dona geralda, desconcertada e envergonhada, tentava ensaiar alguma coisa para se deculpar com os policiais, pelo alarme falso.

Se aproximaram da casa de dona geralda e bateram palmas, chamando a moradora.  Antes que dona geralda saísse completamente de casa, os dois policiais, de olhar soberbo, praticamente empurraram dona geralda de volta pra casa novamente e começaram a fazer uma série de perguntas e com o nariz todo empinado de soberba.  Dona geralda, percebendo a arrogância, ficou na dela e não se preocupou mais em desmentir o dito assassinato.

De repente chega na sala, jorjão, com o rosto em prantos e se dirige aos policiais:

- Vocês vão prender quem fez isso com ela, não vão ?
- Fique tranquilo que vamos pôr o meliante na cadeia.
- Não senhor, eu quero aquele que fez isso com ela.
- Pois é. É justamente desse que eu estou falando.  Como era a vítima ?


- Uma barata.  (Responde dona geralda).
- A senhora quer dizer como uma barata.
- Não senhor, uma barata mesmo.
- Entendi.  A senhora não devia gostar muito dela, não é mesmo ?
- Quem é que gosta de ter uma barata na sua vida ?

E continua o interrogatório...

- A senhora conhece alguém que tinha motivos para matá-la ?
- Claro ! todo mundo.
- Ela era tão ruim assim ?
- Asquerosa eu diria.
- Como ela vivia ?
- Pelos cantos.
- Tinha amigas, parentes ?
- Nossa !  quantos !
- Quando foi a última vês que à viu ?
- Olho para ela o tempo todo.
- Entendi, ela ainda está bem presente ainda.
- Pode se dizer que sim.  Vocês não querem vê-la ?
- Vamos deixar isso para a perícia.
- Tem certeza ?  pode não ser necessário.
- Minha senhora, temos de seguir um protocolo.  À propósito, a senhora poderia nos acompanhar até a delegacia ?
- Para quê ?
- Temos de fazer uma comunicação formal de um assassinato da dona... como era mesmo o nome dela ?
- Asquerosa (responde jorjão, soluçando).
- Minha senhora, preciso do nome verdadeiro dela.
- Barata tem nome ?  Meu filho chamava ela de asquerosa.
- O que ela era sua ? 
- Nada.
- E porque o seu filho era tão próximo dela ? Tanto que está até transtornado.
- É da natureza dele, desde que nasceu.
- Onde está mesmo o corpo dela ?
- O senhor não vai acreditar. (o policial estava quase pisando nela).
- Bom, precisamos ir à delegacia fazer a ocorrência. 
- Por causa de uma barata ?
- Minha senhora, por mais repugnante ou asqueroso, que seja alguém, precisamos notificar o seu desaparecimento ou sua morte.
- A senhora têm os documentos da vítima ? alguma identificação ?
- Seu policial, pra mim, era como se ela não existisse.  Como vou ter algum pertence dela ?
- Ela não portava nada consigo ?
- Sómente aquela aparência asquerosa e repugnante.
- Minha senhora, tenha paciência, logo a senhora se livrará de vês dela.
- É o que o senhor pensa.  Longo, os parentes dela estarão por perto.
- Para o velório.
- Não.  Para terminar o que ela não conseguiu.
- E o quê ela não conseguiu fazer ?
- Vasculhar o meu lixo.
- Procurando alguma coisa para lhe chantagear ?
- Não. Para tirar minha tranquilidade mesmo.
- Qual a relação do seu filho com a vítima ?
- Passatempo, distração.
- Não eram apegados ?
- Por Deus, não.
- Seu filho e ela nunca brigaram ?
- Somente quando ela se perdia pela casa.
- Essa casa não é tão grande assim.
- Para a asqueroza, era.
- Bom senhora, nós vamos andando.  A senhora vai nos acompanhar ?
- É realmente necessário ?
- Já disse, precisamos registrar a sua morte.
- Mas vocês nunca fizeram isso com os parentes dela que já morreram...
- Provavelmente por que não houve denúncia e sabe-se lá onde deixaram o corpo.
- Onde mais ?  No meio da rua.
- Não creio que as pessoas sejam tão insencíveis. (responde o policial).
- Pode apostar que são.  Matam, largam alí mesmo e vão embora. Eu já vi muitos fazerem isso.
- E porque não denunciou ?
- Pra quê ?  São tão insignificantes.  Aposto que até o senhor teria corajem de fazer o mesmo.
- Está enganada.  Nunca, jamais faria uma coisa dessas. (afirma o policial com toda convicção)
- Policial, estamos falando de uma barata.
- É impressionante a forma como a senhora retrata a vítima.
- Mas eu estou falando a verdade.
- Já chega, senão terei de levá-la e indiciá-la como suspeita.
- Suspeita ?  Eu ?  Quando o senhor virar as costas, eu vou pegá-la e jogá-la no lixo.
- Bom saber, vou indiciá-la e prendê-la também por ocultação de cadáver.
- O senhor não pode estar falando sério.
- Pode apostar que estou.
- Quer dizer então que o senhor jamais mataria uma barata.
- Minha senhora, se se referir à vítima desta forma outravês, vou algemá-la. Fique certa que eu honro este uniforme.
- Difícil acreditar.  Estes homens já não são como antes.
- A senhora comporte-se ou terei de prendê-la por desacato.
- Por causa de uma barata ?
- Agora já chega.  A senhora me acompanhe.
- Mas e o meu filho? Não posso deixá-lo sozinho.
- Bem, está bem então, desta vês passa.  Eu vou ficar lá fora esperando a perícia.  E a senhora, por favor, não deixe ninguém se aproximar da vítima.
- Fique tranquilo, o que as pessoas mais querem é distância.  Já posso jogá-la no lixo ?
- Não mexa na vítima em hipótese alguma.  (Responde gritando o policial). 

De repente uma barata cruza o caminho do policial e, sem perder tempo, pisa sem dó nem piedade.

- O senhor não me disse que jamais faria isso ?  Pergunta dona geralda indignada.
- Mas é apenas uma barata.
- É ?  E o que é isso que está no meu tapete esmagado, que o senhor está querendo até chamar a perícia para descobrir quem matou ?  Aproveita, que vai chamar o rabecão e diz que agora são duas.


                                                                                Amadeu Epifânio


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